A pele como promessa ? o erotismo de um encontro anunciado, mas ainda não consumado.
Há encontros que começam muito antes do primeiro olhar. Começam em silêncios, em pressentimentos, no leve arrepio que o corpo reconhece antes que a mente compreenda. Com ele foi assim — uma espécie de aviso que vinha da pele, como se cada poro já soubesse que algo inevitável se aproximava.
Eu o via raramente, sempre entre conversas neutras e distâncias cuidadosas. Mas havia algo na maneira como seus olhos me encontravam que desorganizava o tempo. Não era um olhar insistente; era o oposto. Era um olhar que sabia recuar, que respeitava o limite só para torná-lo mais desejável.
Havia tardes em que eu me pegava imaginando o som da sua voz sem pressa, o calor do seu corpo perto do meu, o perfume que talvez deixasse em minha pele se, por acaso, ele se aproximasse demais. Eram pensamentos que eu tentava afastar — e que sempre voltavam, com mais força.
Numa noite, após uma reunião que terminou tarde demais, nos encontramos no corredor vazio de um hotel antigo. O chão de madeira guardava o eco dos nossos passos. Ele sorriu, como quem reconhece um segredo.
— Parece que o destino gosta de brincar com os horários.
Respondi qualquer coisa, mas o que ficou foi o som da sua voz, grave, baixa, quase uma carícia. Houve um silêncio que durou segundos demais, e nesses segundos, algo mudou — como se o ar tivesse ganhado densidade, e cada respiração já fosse um convite.
Ele caminhou ao meu lado até o elevador. O reflexo no espelho de bronze mostrou nossos corpos próximos demais para serem apenas conhecidos. Não falamos nada, mas o silêncio dizia o essencial: estávamos diante de algo que poderia nos consumir.
Quando a porta se abriu, hesitei. Ele fez o mesmo. O gesto foi mínimo — uma pausa, um olhar, uma respiração que se mistura à outra.
— Boa noite — ele disse, sem sorrir.
Mas quando suas palavras tocaram o ar, o meu corpo respondeu antes de mim. O “boa noite” ficou suspenso, como uma promessa não dita.
Nos dias seguintes, o desejo se tornou presença. Ele aparecia nas coisas mais banais — o toque acidental de uma mão, a lembrança da voz, o perfume que se misturava ao vento. Havia algo de perigoso em pensar nele, mas era um perigo que me fazia sentir viva.
Uma semana depois, nos reencontramos. O mesmo hotel, o mesmo corredor, como se o tempo tivesse voltado apenas para nos dar outra chance de completar o que não ousamos começar.
Desta vez, ele esperou. Eu sabia que ele sabia — que havia um limite que só eu poderia atravessar.
Aproximei-me.
Os sons do hotel desapareceram. O corredor parecia respirar conosco.
Quando parei diante dele, percebi que o corpo fala muito antes das palavras.
— Você sente isso também? — perguntei, num sussurro.
Ele não respondeu. Apenas ergueu a mão, e seus dedos tocaram meu rosto como quem decifra um texto sagrado.
Foi um toque leve, quase imperceptível. Mas naquele instante, compreendi que o erotismo não mora na pressa — mora na promessa.
Às vezes, o desejo é um idioma que só o corpo entende.
O dele dizia tudo sem dizer nada.
Quando nos despedimos, não houve beijo. Apenas o calor da pele, o olhar que durou tempo demais e o entendimento silencioso de que o que nascia ali não podia ser apressado.
A promessa ficou no ar — densa, quase palpável.
E desde então, cada vez que o lembro, sinto de novo o arrepio que antecede o toque.
Como se a pele ainda esperasse por algo que o tempo, por algum motivo, adiou.

